sexta-feira, 8 de julho de 2011

Alexandre Lyrio: repórter do caderno Mais, da parte BaSal (Bahia e Salvador), do blog Moqueca de Fatos e ex-faconiano.

José Calasans e Alice Daltro

Formado em Jornalismo pela Faculdade de Comunicação (Facom) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Alexandre Lyrio (alexandre.lyrio@redebahia.com.br), repórter do Mais do Correio, da parte editoria chamada BaSal (Bahia e Salvador), concedeu-nos uma breve entrevista para este trabalho acadêmico.


Além de seu trabalho convencional como repórter, embora, ultimamente tenha feito mais matérias do tipo “frias” (especiais), escreve no blog Moqueca de Fatos, do Correio 24h. 


Em seu ambiente de trabalho diário, por meio da boa vontade de seu chefe, Alexandre tira alguns minutos de sua rotina de repórter, para nos dar sua opinião e expor experiências deste universo de nosso interesse, estudantes de jornalismo.


Um fato causou uma maior identidade com o repórter, além da sua gentileza em dispor de alguns minutos tão preciosos neste trabalho de causar cabelos brancos, como brincou ele, ele já foi aluno de nossa faculdade, portanto, viveu quase tudo o que viveremos, quanto a disciplinas, experiências e descobertas profissionais, como verão no decorrer da entrevista.


Quando você estudou na Facom?
Bem, eu entrei na Facom, no segundo semestre do ano de 1999.


Começou como estagiário no Correio?
Não. No segundo ou terceiro semestre (não lembro bem) eu comecei a estagiar na TV Aratu com esportes. Na verdade, foi um estágio mais profissional, pois, comecei já como repórter de esporte e trabalhei por lá, durante cinco anos, nessa de “estagiário”.
Então, um belo dia surgiu um teste no Correio da Bahia, que Pablo Reis me avisou sobre. Fiz o teste e hoje estou aqui, muito feliz com a decisão que tomei, de ter saído da televisão, embora eu goste muito do texto de televisão, que nos dá mais liberdade, mas é no impresso que ocorre o jornalismo mais intenso e por isso permaneço aqui no Correio*.


A partir de suas experiências, diga-nos, como entende um furo jornalístico?
Nos jornais impressos de hoje, o furo jornalístico é o que há de mais importante, em todos os sentidos. Posso dizer que é a base de sobrevivência, basicamente, o jornal vive de furos.
Afinal, o que segura um jornal impresso, como o Correio*, são matérias bem pensadas e bem elaboradas, é disso que vivemos, de ter boas idéias. Estamos sempre “quebrando a cabeça” para ter boas pautas e assim ótimas matérias, trazendo bons resultados para o jornal e um conteúdo de qualidade para o leitor baiano.
Mas, o furo em si, também é uma questão de sorte, não só de competência.
Outro dia, por exemplo, estive no Farol da Barra, fazendo uma matéria do tipo “fria” sobre turismo. Levei um rapaz daqui que é bem branco e aparenta alguma descendência com uruguaios, para se passar por turista, pois, pretendíamos registrar a diferença de tratamento dado aos turistas em relação aos baianos, tanto na questão econômica, quanto social mesmo, mas tivemos de pará-la no meio, pois, ocorreu um tiroteio lá mesmo (considerado como furo).
Considero necessário que o jornalista possua uma agenda de fontes “azeitada”, como costumamos dizer, para produzir bons furos de reportagem. É muito freqüente o recebimento de ligações dessas fontes, para “salvar” o nosso trabalho.
Ouve também um caso de matéria sobre um roubo a uma joalheria, que só por ter conversado um pouco com o segurança, descobri que este era um orientador de clientes e que recebia um salário por isso, logo, tal curiosidade já me fez ter mais uma pauta.
É disso que o jornal necessita para se firmar, boas fontes e tino jornalístico por parte dos repórteres.


Há contrastes entre o jornalismo acadêmico e o jornalismo do seu cotidiano?
Eu considero que na Facom, temos muita teoria e isto não é ruim, afinal, nos dá uma noção muito boa do que é esta atividade tanto ideologicamente, quanto no decorrer da história e toda a teoria que vocês estão estudando. Acredito que faltam mais disciplinas práticas. Eu gostava de estudar semiótica, eu me interesso pela forma de visão que você adquire a respeito das coisas. A disciplina de estética, também não fica atrás. Ambas foram muito úteis.
Lembro que tinha um professor do tipo “linha dura” na Facom, um gaúcho, que já deve ter saído de lá. Esse professor era bem experiente, contudo, muito teórico e com isso, nós estudantes, acabávamos ficando meio que sem muita noção do mercado de trabalho.


Qual o público alvo do Correio, para você?
Como não sou dessa área, que envolve pesquisa e estatística, o Editor chefe é quem poderia responder melhor a isso, pois sou um mero repórter. Mas, sei que se fala muito de que é feito para classes C e D e pior é que falam, ou melhor, acusam o Correio de ser um jornal sensacionalista. Eu discordo disso completamente. O Correio consegue avaliar o que vale um maior aprofundamento e o que não vale tanto assim, normalmente nós somos bem equilibrados nesse sentido. Sabemos usar de chamadas, títulos bem pensados/criativos de forma vendável, afinal, o jornal precisa ser vendido, pois, somos uma empresa acima de tudo.
A abertura do caderno Mais não tem anúncio algum, vale ressaltar. Mas é claro que, às vezes, cometemos erros, deixamos de ir mais fundo no que devíamos e podemos deixar passar algo que deveria ser mais bem explorado por nós. Somos versáteis, pois, o nosso formato gráfico, permite que coloquemos no 24 Horas as matérias menores, com textos menos aprofundados, com uma foto ruim ou até mesmo sem fotos. Também, quando ocorre, ao invés de não ter foto, termos uma boa foto (bem tirada e ou chamativa) nós usamos da Página 3, afinal, é onde o leitor ao abrir o jornal irá se deparar logo de cara, trazendo-o para a leitura da respectiva matéria e das outras.
Enfim, o que quero dizer com isso é que o Correio* vence dos demais, pois, consegue vender bem as matérias, com chamadas criativas e fortes na capa. Quanto ao público, acredito que varie entre classes B e C. Mas é muito relativo, mesmo. Por exemplo, há muitas pessoas de classe A ou B que não leem o caderno Vida, pois, não se interessam por ele.
Uma experiência própria: Fiz diversas matérias sobre Irmã Dulce, chegamos a ganhar um prêmio por isso e é tudo resultado de o jornal ter apostado em tal conteúdo, pois, somos equilibrados, como disse antes, não somos sensacionalistas, mas sabemos vender com qualidade e chamar a atenção sem nenhum tipo de abuso.


Quais os critérios de noticiabilidade mais importantes? A morte é maior?
Não necessariamente. Por exemplo, se o governador bater a testa numa bancada, isso virará notícia, sem necessariamente que ele morra ou que sofra algum acidente grave (brinca). Isso da importância depende muito da dimensão do acontecimento e do número de leitores, ou seja, se o assunto irá atingir uma quantidade considerável destes.
Acho interessante e ao mesmo tempo estranho, pois, hora ou outra me pego pensando nisso: Um dia apostamos num determinado assunto, que outrora, até mesmo na semana passada, não foi dada o devido valor, talvez por ter acontecido antes algum outro evento de grande porte que tenha ofuscado a nossa visão e também ocorre o contrário, deixarmos de dar a devida importância a algo e depois percebermos o erro.


A concorrência jornalística chega ao ponto de modificar uma matéria já existente ou a ter de investir em alguma, excluindo outra?
Isso depende também, porque ocorrem momentos onde há forte concorrência e outros em que ela não existe, afinal, algumas matérias são muito exclusivas. O assunto é deles (concorrência) e pronto. Quando há essa possibilidade de competir, tanto furos jornalísticos, como assuntos em alta, nós “nos jogamos de cabeça”, corremos atrás e muitas vezes conseguimos dar melhor que eles e em outras não. Acontece muito dos jornais se pautarem. Pois, nossos furos pautam o concorrente e os furos dele nos pauta também.
Teve uma matéria minha que foi muito comentada na época, de Propina em cartórios, pois, usei de uma câmera escondida para flagrar o ocorrido e é claro que a concorrência não tinha o que fazer, afinal, a gravação nos pertencia, eles não tinham nenhum material, o furo era do Correio, portanto, exclusivo. No máximo, o concorrente fez um comentário ou algo relacionado no dia posterior, mas fomos nós os únicos que por vários dias exploramos o tema.


Em dias de poucas notícias, embora, quase impossível, vocês sentem a necessidade de preencher o espaço (folhas), com diversidades de acontecimentos, mesmo não tão importantes?
Isso realmente é muitíssimo difícil, ainda mais no correio com o espaço reduzido. Tem dia que temos uns determinados assuntos, mas, estes não são suficientemente fortes, não dão uma boa capa e ou não possuem foto. Costumamos não só nesses casos, como normalmente mesmo, buscar recursos gráficos variados, infográficos e figuras para substituir/acrescentar nas matérias. Acho que uma foto diz muito. Tem o mesmo valor de um texto.


Como é a sua rotina de trabalho?
Às vezes passamos 12 horas numa redação. No meu caso, sempre trabalhei de manhã e nesses casos, já é quase de lei que chega a hora do almoço, você vai, almoça e volta ao trabalho e quando vê termina o expediente no turno da noite.
Embora, ultimamente tenho ficado com o turno da tarde para produzir matérias “frias” (especiais). Costumo usar o tempo que me sobra com as fontes e então chega um momento que tenho de parar para terminar o texto. Há uma máxima do jornalismo que é mais ou menos assim: Uma hora temos que parar de apurar, senão a matéria não fecha.
Com a chegada do atual Diretor de redação, diminuiu-se a carga horária nos finais de semana, pois, quando você faz o plantão em um final de semana, depois, ganha três outros finais de semana de folga.
As matérias frias foram feitas durante a semana e no final de semana, no plantão de Cidade, todos trabalham nestas áreas, para remanejar o jornal.
É até engraçado, pois, o chefe fica no pé da gente para não darmos hora extra, mas também fica no nosso pé para fazer uma boa matéria, usarmos as fontes e etc..


As matérias do Correio costumam atender a uma política da empresa ou o jornalista é completamente livre para escrever, sem ter de se vigiar em discussões políticas?
Eu trabalhei no antigo Correio da Bahia e realmente ele era mais político do que hoje, pois, desde a mudança para o Correio* (atual), a o próprio dono preferiu reduzir sua carga política, tanto que hoje a área de política não é tão explorada assim. Mas, a tendência política no antigo Correio restringia-se a parte específica de Política.
Eu que trabalhei na editoria de Cidade, percebia uma autonomia muito grande, mas, é claro que não se podia bater de frente, afinal, temos sem um dono. Naquele antigo jornal, além do caderno de Cidade tinha também o de Repórter. Contudo, nós considerávamos muito injusto que falassem que éramos tão políticos assim.


Em qual horário costumam fechar a edição do jornal do dia seguinte?
Acostumávamos, por questão de impressão (da gráfica) a fechar uma primeira rodada umas 20h30 e a segunda rodada por volta de 23h, mas, atualmente só temos uma rodada, que ontem fechou às 22h.


De quais formas vocês costumam chegar até um acontecimento, como são informados?
Fazemos rondas, onde repórteres e o pessoal do site fazem entram em contato com a Polícia, Transalvador, Bombeiros e Defesa civil, nas busca por crimes e acidentes. Também podem vir por meio das fontes de reportagem. Depende do jornalista, possuir e saber lidar com as mesmas.
Posso dizer que: Linda Bezerra (chefe de reportagem) é uma fonte inesgotável de fontes.
Há também os casos das fontes telefonarem para cá sugerindo algo ou até mesmo os próprios leitores que escrevem para o jornal.


Há alguma dificuldade no transporte de jornalistas para cobrir matérias na rua?
Não. Assim que chegam as informações de um caso que necessite logo de uma cobertura, enviamos alguém o mais rápido possível. Devemos possuir uns nove carros disponíveis aos jornalistas, mas já ocorreu numa ocasião rara, de termos pego um táxi.
Deseja dizer algo mais aos estudantes de jornalismo da Facom?Para ser clichê: Jornalismo é uma profissão apaixonante, apesar do salário, afinal o mercado é muito cruel mesmo. O jornalista tem de meter a cara para estudar e entrar no mercado, sendo um bom repórter.


quarta-feira, 6 de julho de 2011

"O jornalismo é universal, você tem que ser didático": Rodrigo Meneses, repórter do Massa!

Júlia Belas e Luiz Fernando Teixeira



Rodrigo Meneses é repórter do Massa!, e seus textos muitas vezes são aproveitados também pelo jornal A Tarde. Durante nossa entrevista, Rodrigo nos fala sobre a estrutura dos dois jornais, as suas diferentes metodologias e linhas editoriais, além de comentar algumas das matérias de sua autoria que foram publicadas durante o período de análise dos jornais.

Quando um repórter é contratado pelo Grupo A Tarde, ele é escolhido para um jornal já definido?
Como o Massa! é novo, tem oito meses, vai completar um ano dia 7 de outubro, eu e as pessoas que estão trabalhando no Massa fizemos uma seleção para trabalhar lá. Foram seis etapas. Mas você é contratado para trabalhar ou no Massa! ou no A Tarde. Abriram várias vagas no A Tarde, as pessoas são contratadas para trabalhar num veículo específico.

Como são escolhidos os repórteres que escreverão matérias para os dois jornais?
É um grupo de comunicação. No A Tarde tem o Massa!, tem o A Tarde, tem o A Tarde online, tem a Web TV. No Massa! e no A Tarde, como são impressos, as reuniões de pauta são entre editores dos dois jornais. Tem um secretário de redação para os dois jornais nas reuniões, e tem pautas que são do interesse dos dois jornais. Os materiais acabam sendo aproveitados.

Como é a estrutura das redações do Massa! e do A Tarde?
A equipe do Massa! é bem menor e o jornal A Tarde é aquele jornal tradicional. O Massa! tem uma equipe reduzida, tem uma editora-chefe e os editores de cada editoria: editoria Geral tem dois editores, um que pega a parte de Polícia e o outro com Economia Popular e Educação. Economia popular são vagas de emprego e outras coisas de economia que interessam mais o público do Massa!, classes C, D e E. E tem a página "Nas Ruas", que é matéria de bairro. Costuma ser a 7 [página], costuma ter matérias sobre bairros e ruas de Salvador. A editoria de Esportes tem um editor e um sub-editor também. Na editoria Bem viver são matérias de entretenimento, saúde, comportamento. Cada editoria tem dois editores. Esportes, dois repórteres, bem viver só tem uma repórter, geral tem três repórteres, geralmente dois em polícia e um na parte de economia popular. O repórter do Massa! acaba fazendo matéria não só de polícia, mas de tudo. Além das estagiárias.

O que essas redações dividem em termos estruturais, tipo equipamentos, carros, o próprio espaço...
O Massa! tem três carros, mas quando tem problema, por exemplo, quando já tem três repórteres do Massa! na rua e o carro do A Tarde tá aí parado, a gente pode pegar o carro do A Tarde. Porque o Massa! só é uma segmentação do produto, mas a estrutura é dividida, mas caso haja algum empecilho, você pode utilizar. A redação é no mesmo espaço, tem uma bancada de repórteres, diagramadores e editores que é do Massa!. Mas também às vezes, o repórter do Massa! tá na rua e não tem computador, o do A Tarde pode usar a máquina. Para a equipe do jornal ficar mais próxima, eles dividiram a redação e ficam os repórteres, editores e diagramadores do Massa! em uma bancada.

Qual a rotina pra você, que escreve tanto pro Massa! quanto para o A Tarde?
Depende dos horários. O A Tarde tem vários horários. O pessoal da manhã chega 8h, o turno da tarde entra 14h e quem fica no plantão chega às 17h. A carga horária é de 7h.

Vocês trabalham como uma dupla, com fotógrafo específico pra cada repórter, ou trabalham com aquele que estiver disponível?
O Massa! trabalha assim. Sempre é uma dupla, porque no Massa! são dois fotógrafos, um para o turno da manhã e outro para a tarde. No caso, eu, que pego pela manhã, sempre saio com aquele fotógrafo, e o repórter que sai de tarde sempre sai com aquele mesmo fotógrafo também. No A Tarde é mais difícil você trabalhar sempre com aquele mesmo fotógrafo, é o que estiver disponível na hora.

Quando você recebe uma pauta, já sabe que será para um dos ou para os dois jornais?
Não é sempre que a gente sabe. Isso vai depender do resultado que vem da própria pauta mesmo. Tem uma matéria que foi publicada hoje (29/06) sobre uma capitã da PM que foi escolhida para ser a comandante da base de segurança comunitária que vai ser instalada no Calabar. Eu pego a entrevista que foi publicada no jornal de ontem (28/06), em que o coronel da PM falou: “-Fiz um convite à capitã Roseane para ser a comandante da base de segurança do Nordeste, que será instalada”. Então eu aproveito essa pauta de ontem para entrevistar essa pessoa e saber que material será apresentado para o A Tarde também, mas nem sempre você sabe. Eu mesmo, que trabalho em Polícia...tem coisa que acontece no dia-a-dia da cidade que se for do interesse do A Tarde eles publicam também.

O Massa! é um jornal que não sai aos domingos. Qual o procedimento com os acontecimentos que surgem no sábado?
O Massa! não sai dia no domingo, segundo o que nosso editor falou, porque tradicionalmente os jornais populares não saem dia de domingo, e também para não competir com o A Tarde, já que há aquela tradição de comprar o A Tarde no domingo, tem gente que só compra no domingo, e por isso o Massa! não circula nesse dia, para que não haja essa competição, e as pessoas que compram o Massa! comprarem o A Tarde dia de domingo. Segundo o que eles passaram pra gente, o pessoal que está lendo o Massa! pode ser uma classe que está em ascensão, que está lendo o Massa! mas que pode entrar pra uma faculdade, ascender pra uma nova classe econômica, e possa virar um leitor do A Tarde depois. É uma questão de estratégia para esse público que não lê jornal e poderá passar a ler o A Tarde também.

Com relação às matérias sobre Nem Gorda, foram vários dias quase sequenciados tratando desse assunto; não seria mais fácil manter uma pessoa responsável por acompanhar o caso ao invés de repórteres diferentes?
Eu fiz uma matéria do dia em que ela foi presa, porque foi dia de domingo e eu estava trabalhando aqui. Aí na segunda já foi meu colega João Eça que foi fazer, e ele foi dar continuidade, e depois dessa matéria na segunda-feira, ele foi fazer todas as matérias sobre Nem Gorda. Ele até conheceu o advogado dela, estreitou os laços para ter mais acesso às informações.

As matérias “Investigador é sepultado sob clima de consternação” do A Tarde e “Presos 3 acusados de matar policial” do Massa!, ambas do dia 02/06, começam com o mesmo lead, mas a abordagem é diferente. Por que houve essa distinção?
Às vezes o Massa! brinca mais nos títulos, manchetes, é uma orientação pra gente, porque o jornalismo é universal, você tem que ser didático, falar numa linguagem simples, para todo o público entender. Aí no Massa!, há aquele caráter de novela, que permite você brincar mais na narrativa, e no A Tarde você tem liberdade de criação também, mas é um jornal mais sério, aí você acaba escrevendo até um texto meio careta, mas há uma certa liberdade criativa. A depender, existem certos termos você não vai usar.

Ainda nessas matérias as fotos utilizadas são diferentes. Qual o critério de escolha?
Geralmente é acertado entre os editores não usar a mesma foto. Até a própria abordagem do Massa! vai pela questão mais emotiva, mais humana. Tenta pegar a questão da emoção, da história das pessoas. Isso também é um critério de definição. Também não se usa muito foto subjetiva. A foto não precisa descrever o texto, pode ser mais subjetiva pra provocar uma interpretação a mais do leitor. No Massa! geralmente se usa foto mais direta, que já esteja explícito o sentido naquela foto.

Há alguma dificuldade em fazer uma matéria que seja uma seqüência de outra escrita por outro repórter?
Tem dificuldade quando não há comunicação entre os repórteres. Mas quando a gente se comunica, troca os telefones, passa os contatos... O melhor seria se a pessoa continuasse, mas você vai quebrar esse grau de dificuldade conversando com o colega, um passando o que apurou para o outro.

As matérias “Mulher induz filho a fazer disparos contra o marido” e “Mãe põe pilha e filho atira no pai”, do dia 07/06, têm praticamente o mesmo texto, mas no Massa! ela recebe maior tamanho e destaque. Por quê?
É que o A Tarde, inclusive é uma queixa nossa, é um jornal onde há várias matérias já planejadas, matérias que não são do dia. Essas matérias acabam preenchendo o espaço da edição. E também vai pelo entendimento do editor do A Tarde mesmo, às vezes um fato que é uma matéria no Massa! ele dá uma coordenada, uma notinha, uma curta no A Tarde. O Massa! tem dois altos nas páginas 4 e 5, duas matérias principais de polícia e várias curtas. Aí é a aposta da gente, pelo tema, um filho atirar contra o pai. Aí o Massa! explora mais, tem mais espaço. Às vezes, o A Tarde dá duas páginas de segurança, uma página de segurança inteira, e acaba tendo mais espaço do que aquelas duas páginas do Massa!.

As matérias “Militares treinam ação de salvamento com apoio aéreo” e “Homem ao mar! Operação resgate”, ambas do dia 09/06, apresentam o mesmo texto. Mas por que o intertítulo “Capacitação” (A Tarde) ou “Parceria” (Massa!) é um texto no primeiro e no segundo aparece na forma de box?
Muitas vezes eu faço a matéria aqui, no Massa!, e vou embora. Eu nem sei se a matéria vai ser aproveitada pelo A Tarde, não é toda vez que você sabe. Tem vezes que o A Tarde pega meu texto e preenche o espaço. No Massa!, as matérias são mais divididas, enquanto no A Tarde o texto é corrido. Algumas vezes o A Tarde tem mais espaço, aí perguntam “você tem mais alguma informação?”, dão mais espaço pra eu contar essa história melhor, aí eu preencho e o texto fica mais diferente.

Nessa mesma matéria, o último parágrafo da parte “Parceria” é uma declaração. Já no Massa! ele ganha um destaque maior, aparecendo em uma nota e com o título “Ligados na Copa 2014”. Por quê?
No Massa! nunca é uma matéria só, sempre tem uma coordenadinha. A gente divide. Quando tem uma parte da matéria sobre determinado assunto, eu coloco nessa coordenada, enquanto no A Tarde ela pode vir toda no texto corrido, por causa do modelo editorial do jornal.

Sobre as matérias “Enterro de motorista vira ação de protesto” (A Tarde) e “Protesto pela morte de um trabalhador” (Massa!), do dia 10/06. A primeira foi escrita por você e por Paula Pitta, além da colaboração de Juliana Dias. Por que o nome de Juliana não foi colocado na parte onde normalmente vêm as assinaturas?
Quando vem como “colaborou” é porque ela fez uma parte pequena, pouca coisa. Quando se assina a matéria junto, é porque as duas pessoas apuraram bastante. “Colaborou” é quando você está na redação e precisa que alguma pessoa fale com alguém, pegue uma declaração, questione isso a essa pessoa. Vai pelo que você produziu daquela matéria. Se ela tivesse produzido tanto quanto eu e a outra repórter, aí o nome dela viria em cima também.

Pelo fato de o domingo ser um dia no qual geralmente ocorrem menos acontecimentos, os jornais de segunda-feira têm uma tendência a trazer matérias com caráter de reportagem, como no Massa! do dia 13/06, cuja página 3 era a matéria “Carteiros em estado de nervos”. Essas reportagens são pré-selecionadas para o dia ou ficam reservadas?
A gente planeja esses assuntos que não são quentes, factuais. Como no domingo trabalhamos com a equipe reduzida, a gente tem que sempre fazer uma matéria que é chamada “de gaveta” na edição de segunda-feira. A gente tem que fazer essa matéria durante a semana, preparar a reportagem durante a semana, porque com a equipe reduzida você não vai ter condições de fazer o jornal inteiro.
A matéria sobre o enterro do ex-vocalista Germano, do Olodum (“Despedida ao som dos tambores” no Massa! e “Tambores soam no adeus ao vocalista do Olodum” no A Tarde), tem maior destaque no Massa!, ocupando toda a página 3, enquanto no A Tarde ela recebe menor atenção. Por quê?
O Massa! tem a página 3 que são as notícias do dia, que são aquelas notícias que fazem a diferença, ou sobre pessoas que fazem a diferença, histórias assim, estilo reportagem, alguma coisa forte do dia... A página 3 do Massa! é a que tem mais espaço. No A Tarde, deram uma foto grande na capa, mas o espaço não foi tão grande. Isso é coisa pro editor do A Tarde responder. O que ele teve no dia, não deu tanta importância, achou que não deveria ter aquele espaço que veio no Massa!. O Massa! deu aquele espaço porque eu tenho mais contato com o pessoal de lá, e eu vendi a idéia dizendo que o enterro encheu, as pessoas choraram... Eu nunca tinha visto uma coisa daquelas. As pessoas cantaram durante o velório, o enterro tava marcado pras 11h e só aconteceu às 11h40, porque o pessoal ficou cantando as músicas que o cara compôs, pararam para rezar a missa e depois continuaram cantando em homenagem a ele. Era muita gente, e o cara foi um cantor importante do Olodum, que é um bloco afro popular, aí eu vendi a idéia. No A Tarde eu não fiz isso, como eu não tenho essa relação muito próxima com o editor.

Ainda sobre o enterro de Germano, como abordar as pessoas que estão lá, chorando a morte de algum ente querido, para conseguir uma entrevista?
É difícil. Você tem que saber chegar, ter a sensibilidade, cumprimentar as pessoas, se apresentar... A pessoa que está chorando muito não dá pra falar. Por isso que é bom chegar antes, que o momento de mais emoção é quando vão depositar o caixão, daí você conversa antes, que as pessoas estão mais serenas. Às vezes, tem aquele parente que se emociona mais, você não consegue falar, ou então vai esperar um momento que ele esteja mais calmo para poder falar. As pessoas compreendem que é o seu trabalho, mas tem gente que não entende... A mulher daquele motorista mesmo estava falando normal, mas o pessoal ficava dizendo “se você não quiser falar não fale, é tudo um bando de carniceiros”, como se a gente quisesse explorar a miséria da pessoa, a dor da pessoa. O leitor, quando pega o jornal um dia, quer ler uma declaração póstuma, ou se teve uma convivência próxima com a pessoa que morreu, gosta de ler. Quando você vai abordar uma pessoa pra entrevistar, você não obriga ela a falar. Você se apresenta, pergunta se ela pode te responder, se ela não quiser você não vai forçar a barra. Eu mesmo chego educadamente, espero um momento oportuno pra chegar, me apresento, pergunto se poderia conversar um pouco... Se a pessoa concordar a gente conversa. Se não quiser, eu não vou forçar a barra nesse momento de dor, num cemitério. Agora, tem outras situações que você tem que insistir mesmo, mas cemitério... Se a declaração da pessoa tá ali, foi porque ela quis.

Linda Bezerra: "A minha grande afeição pelo jornalismo é a arte de contar histórias. É fabulosa essa possibilidade. "

Por Juliana Alves e Luana Amaral



A Chefe de Reportagem do Correio, Linda Bezerra, nasceu no interior do Piauí, em uma cidadezinha onde só havia 15 casas, o ensino ia até a quarta série, e a única profissão que parecia existir para ela era a de professora. Quando se mudou para Salvador, Linda trabalhava durante o dia e estudava à noite. Foi assim que ela passou no vestibular do Curso de Jornalismo da UFBA e descobriu sua paixão pela profissão. O sonho de ser cineasta permaneceu como um projeto futuro, mas não esquecido, porque, segundo Linda, no jornalismo ela faz aquilo que mais gosta: “contar histórias”. Linda bezerra já foi pauteira nacional do jornal da Band, e trabalha há 15 anos no Correio. Em entrevista Linda comenta sobre a mudança da linha política do jornal, as acusações de que o Correio não aprofunda temas e defende o new journalism.


Queríamos que você falasse um pouco da sua careira

Eu fiz jornalismo porque eu queria ser cineasta. Queria, não. Quero. Então, a única faculdade que tinha disciplinas que estudavam cinema era a UFBA, na época. Isso em um primeiro momento. Depois imediatamente me apaixonei por jornalismo. Adoro estar no meio do burburinho, e onde tem ação tem jornalismo, tem pessoas investigando, contando histórias.Hoje eu posso dizer que a minha grande afeição pelo jornalismo é a arte de contar histórias. É fabulosa essa possibilidade. Entrar na vida das pessoas, não como bisbilhoteira, mas participando um pouco das coisas mais intimas, das historias, das emoções, das vitorias, dos fracassos, das tristezas, das alegrias. Enfim, como síntese, o ser humano me interessa.

Entrei no correio e um mês depois na Band, como apuradora. Na Band eu me transformei imediatamente em pauteira, que a meu ver, é minha grande vocação no jornalismo. Pautar é descobrir as histórias pra contar. Na pauta você tem toda essa possibilidade, sem falar que você entra em contato com uma coisa mais administrativa do jornalismo, que é algo que as pessoas não gostam de fazer. Fui me transformando, a princípio, na pauteira nacional da TV Band. Pautei durante nove anos, ou seis, não lembro bem, a Bahia. É um trabalho árduo pautar o nacional. Você tem que juntar um assunto que é de interesse nacional, mas com um olhar local. Também fui editora chefe no jornal local e às vezes do nacional. Essa foi minha carreira na Band.Aqui no correio comecei como apuradora, e passei para a produção. Eu pautava um pouco, mas principalmente produzia as pautas que surgiam. Ou seja, eu buscava as melhores fontes, os melhores focos, enfim, eu cuidava pra pauta sair. Era uma função que tinha no jornal impresso, hoje não tem mais, mas na TV isso é absolutamente fundamental por conta do timing do repórter. Daí passei para a chefia de reportagem.


É o que você faz agora...

É. Hoje tem o nome de editora de abertura. Depois daí fui coordenadora do caderno “Correio Repórter” durante anos, um caderno que se diferenciou porque contava histórias.


Ainda naquele formato antigo?

Isso. A partir de 2008, quando o jornal muda, eu passo a editora, que é o nome que eles dão, mas continuo, na verdade, fazendo pauta. Eu faço pauta em BaSal (Bahia/Salvador)


Você pode falar sobre sua função de pauteira no jornal?

O que me inspira a fazer pauta? Tudo. Eu já fiz pauta sonhando. É uma vocação, caso contrário seria um fardo. Eu acordo pensando em pauta, mas eu gosto. Eu já saio com o olho aberto pra coisa. Qualquer coisa me inspira uma pauta, dentro do meu foco nesse momento, que é a cidade. Qualquer coisa, qualquer situação pode me inspirar. O que eu não gosto muito é de release. Se for release eu olho, olho. Se tiver noticia eu boto, noticia é noticia não se discute. Release que chega com noticia eu dou a maior atenção. Release que chega com sugestão de pauta para vender seu assessorado eu penso dez vezes.


Como é sua rotina no jornal?

Eu chego aqui todo dia muito cedo, entre seis, seis e meia, no máximo sete. Antes, em casa, eu já leio o jornal. Chego aqui, leio os outros jornais, abro meus 2000 e-mails que recebo diariamente, atendo todos os telefonemas, vejo televisão, entro em sites nacionais. Enfim, assisto a tudo que eu posso. Às 10 horas tem uma reunião com a cúpula, formada pelo editor chefe, editor de abertura, por mim, que represento o BaSal, pela pessoa que representa Economia, a editoria Vida*, que é de cultura, e a de esporte. Nessa reunião a gente discute o que o jornal vai dar, define capa, define A3, que é o “filé” do jornal. Define abertura do mais, as outras três matérias do mais, define vida, define o esporte, define tudo. O Vida*, como é um caderno mais frio, geralmente já está pronto. Mas é possível mudar ou acrescentar coisas. No dia que Liz Taylor morreu, por exemplo, a matéria que estava produzida caiu e deu espaço a uma matéria sobre ela. Então, nessa reunião, é produzido e enviado um relatório para os editores. A parte da manhã produz o jornal, escolhe os temas, põe a equipe na rua. A parte da tarde, que chega a partir das 15 horas, vai, digamos assim, dar molde a esse jornal, escolher os melhores títulos, escolher as melhores fotos. Às 17 horas tem uma reunião para saber o que realmente colou, o que não deu, o que bombou no dia. A abertura do jornal já está definida desde cedo e dificilmente muda, mas mudou, por exemplo, no dia em que Palocci caiu. Foi às 8 horas da noite e obviamente já estava pronto o panegírico, que é como a gente chama. Vocês conhecem a estrutura do jornal, não é? A 3 é uma espécie de horário nobre no jornal.Na 4 a gente concentra assuntos da cidade, quando a bandidagem não resolve tomar conta de tudo.Na 6 concentramos normalmente assuntos sobre segurança. Também vou vendo quais dos assuntos da minha editoria são mais importantes para eu oferecer pro Mais*.


No Mais* os assuntos serão aprofundados...

Isso. Quando eu escolho o assunto eu tenho que pensar o foco, porque os fatos são iguais pra todo mundo. Vou dar um exemplo: buracos na cidade. Toda chuva a gente cobre isso, não tem como não cobrir. Porque é uma coisa que desagrada as pessoas, diz respeito a todo mundo. O meu objetivo como notícia continua o mesmo, o que eu tento diferenciar é como eu conto essa notícia. Porque a notícia está na internet desde cedo. O desafio do jornal é disputar leitura. Como eu vou contar essa história? O “como” é muito mais importante para mim do que o “que”. O “que” é importante, mas eu foco no “como”. Como eu vou contar a história. Então vou contar um exemplo bobo, mas que deu muita leitura: buracos na cidade. Tem muito buraco, muita ligação. Eu pensei: podia fazer aniversário de buraco, e aí a gente botou “Buracos em festa”, porque na verdade os buracos fazem aniversário em Salvador. Tinha um de três meses, tinha um de seis. É só você procurar que encontra cada história sensacional pra contar.Outra coisa: não pode brigar contra o leitor. O que é que o leitor quer ler nesse jornal? Todos os dias eu penso nisso. O jornalista às vezes não se vê como leitor, se vê como gerador de notícias. Não pode brigar com o leitor. Isso é uma grande burrice que a gente comete, empáfia de jornalista que enche a boca e se esquece do leitor. Esse dever de casa eu faço todo dia quando eu penso em uma notícia .


Qual a classe social que prioritariamente lê o Correio*?

Existe um núcleo de pessoas que ouve os leitores. A gente traça o perfil do leitor do Correio*, o leitor do domingo, da segunda, da terça, da quarta... A classe média hoje faz tudo mais do que qualquer outra. Primeiro, porque a classe média cresceu. Mas o Correio* está bem equilibrado. A classe C lê mais, mas tem uma parcela grande na classe A. A última vez em que vi esses dados a gente tinha 45% de classe A, o que me deixou até surpresa. Parece também que os homens lêem mais. Mas não lembro se os números ainda são os mesmos.


Você trabalha há algum tempo no Correio e acompanhou a mudança em relação à linha política do jornal, que era estreitamente ligada aos interesses de ACM. Como foi essa mudança?

Foi árdua, uma mudança muito dura. Mas foi desafiador e uma das melhores coisas que já vivi na minha carreira de jornalista. Primeiro, o desafio foi pessoal, você está enferrujado, totalmente enquadrado em um modelo que era antigo. Porque, de fato, O Correio hoje faz um jornalismo diferente. Eu, pessoalmente, acho o jornal sensacional do ponto de vista gráfico. Ele é realmente interessante, porque, primeiro, ele dá as notícias que estão na internet e que interessam às pessoas no tamanho que elas precisam. As pessoas lêem rápido, se informam, se atualizam logo cedo, e se aprofundam nos assuntos que o jornal escolheu como os mais importantes. Foi o jornal que escolheu? Foi. Ok. Cabe ao leitor continuar nesse jornal ou não. O leitor termina por fazer a escolha dele. A princípio a gente foi muito criticado por não aprofundar os assuntos. Balela. Você pode não aprofundar todos os assuntos, mas os assuntos escolhidos para se aprofundar são aprofundados. Essa questão do aprofundamento já caiu por terra. Inclusive, os concorrentes já não falam mais isso. Eu li uma notícia no “24 h” nosso, e li a notícia em outros jornais.A gente tinha tudo que eles tinham. Tudo, absolutamente tudo, como notícia. O correio era de fato um jornal que não tinha lucro, era um jornal a serviço de ACM. Como qualquer jornal do país é a serviço do seu dono. Não sejamos ingênuos quanto a isso.Ou há interesse político ou há interesse comercial.Agora o jornal tem interesses comerciais e políticos, porque o dono é um político. Somos uma empresa, como também é A Folha de São Paulo, como é O Globo, o A Tarde, como são os jornais. Sabe qual foi a grande mudança em minha opinião? Hoje o jornal dá todas as versões de um fato. Quando a gente noticia política, a gente dá a versão de ACM Júnior, a versão de Wagner, a versão de não-sei-quem. E aí pronto, é um jornal plural, como todos devem ser. O jornalismo pra mim é isso: você contar os fatos de todas as formas que você puder contar. O Correio deu uma manchete histórica pra mim, que foi: “Wagner ultrapassa nas pesquisas para Governo do Estado.” O Correio nunca havia noticiado isso. Quando vi aquela manchete eu pensei: o jornal mudou. É de interesse dos donos desse jornal mostrar a política da cidade. Eles são empresários, são políticos, mas não interferem no jornal impondo nada. Não sou ingênua de dizer que o jornal vai publicar uma matéria contra os interesses das empresas do grupo. Não vou fazer apologia à mentira. Eu nunca recebi nenhuma orientação para não dar determinada matéria. Tem matérias que eu sei que eu não vou dar, por exemplo, uma passeata contra ACM. Não vou dar porque eu tenho bom senso.Já cansei de dar coisas que entram em conflito com a empresa, aí eu dei também o lado da empresa, e pronto, resolveu o problema. Há um bom senso, eu tenho um cargo de confiança, mas não chega para mim uma tábua escrita”dê isso, dê aquilo”.



Quais são os critérios de noticiabilidade do Correio?

O leitor é o meu critério de noticiabilidade. Todo o critério clássico é levado em conta. Existem os assuntos relevantes e os assuntos interessantes. Quando você pode juntar o relevante e o interessante é perfeito. Eu dou atenção aos dois. Amo trabalhar com assuntos interessantes. Por exemplo: “Caiu na rede ninguém segura.” Essa matéria é interessantíssima, mas também é relevante, porque as pessoas devem ter cuidado com seus arquivos pessoais no trabalho.Essa matéria é sobre uma rapaz do Ingá, cuja pasta pessoal de pornografia, de transa com a namorada, de tudo que você possa imaginar, foi parar no site do Ingá.É interessante isso? É. Mas qual a relevância disso? Você tem que alertar as pessoas de que elas precisam tomar cuidado.Por que eu não daria a notícia? Por que tem pornografia? Não vou deixar de dar mesmo. Foi uma das matérias mais lidas do jornal. O critério de noticiabilidade é o que interessa ao leitor.

Um exemplo de “matéria interessante” é aquela do Bruno Surfistinha, não é?

Você gostou de ler aquela matéria?


Gostei. É interessante porque é a história de um homem que se prostitui, se dá bem, tem um blog e uma namorada (!).

E uma mãe que não sabe de nada! É a história do ser humano, querida. Isso é o ser humano, e é isso que eu gosto de contar. Quando essas histórias chegam eu pipoco de alegria. Como não contar uma história dessas? Vale ressaltar que a gente só consegue fazer esse tipo de matéria porque todas as loucuras que eu entrego como pauta Sérgio (o Editor Chefe) normalmente compra. Na minha opinião isso faz a diferença no jornalismo.Não sei se eu conseguiria fazer isso em outro jornal.


Na matéria sobre a prova de natação que o prefeito João Henrique participou tem um trecho que diz: “João parecia pensar que cada braçada era um problema da cidade. Cada bóia contornada era como se livrar das críticas à Orla, à obra do metrô ou à Estação da Lapa.” Isso é uma construção literária...

Você já deve ter lido sobre o new journalism. Eu sou completamente favorável a esse movimento. Agora, no dia a dia não dá pra fazer literatura. É só a técnica da literatura que você usa. Porque no jornalismo tem fatos que você tem que levar em conta.Como contar a história é que me interessa.Eu vou dizer uma coisa a você: essa matéria está completamente dentro dos fatos. Aconteceu um fato, João Henrique foi nadar. “Prefeito que nada” é perfeito, porque realmente, ele não está fazendo nada. E ele dá de bandeja essas coisas pra gente. O que acontece: você coloca um jornalista com um texto criativo. Aí, há uma construção que quase apropria de um modo de contar história na literatura, mas é totalmente dentro do contexto, porque a cidade realmente está acabada. Enfim, você não ta fugindo disso. É esse jornalismo que eu quero fazer. Eu não quero fazer literatura. Eu quero fazer um jornalismo que possa contar uma história razoavelmente criativa, com técnicas menos diretas, menos objetivas. E a gente tem toda essa chance, porque a gente tem a página 3, na qual a gente pode fazer isso. O Correio, na verdade, sempre teve esse jeito de contar. Se você ler o Correio antigo, o “Aqui Salvador”, que era a editoria de cidade, sempre foi mais ou menos assim. O que é uma novidade nesse jornal é a linha editorial.O editor novo ama esse tipo de jornal, então a gente meio que se espalha por conta dele. No outro jornal nós só nos espalhávamos na editoria de cidade. O outro jornal, como um todo, não refletia isso. Mas o outro editor, Demóstenes Teixeira, deixava a gente fazer isso em “Cidade” porque se cuidava mais da política.


O Correio* explora recursos visuais, utiliza muitas fotos e cores. Algumas vezes as fotos ocupam mais espaço que o texto .O público do Correio dá preferência às imagens do que ao texto?

Outra coisa que esse jornal me ensinou e eu tive que me desenquadrar: as fotos contam tanto quanto os textos. Então não justifica você não dar fotos. As pessoas às vezes dizem: “Ah, tem pouco texto”. Leiam as fotos. A gente não tem cultura de ler as fotos. As fotos trazem informações sensacionais. A matéria do “Buraco em festa” não existe sem as fotos. Há várias narrativas para contar uma história: ping pong, perguntinhas rápidas, radar com números. De quantas formas eu posso contar essa história? Às vezes só com fotos, às vezes só com gráficos, às vezes só com textos e números.


A mudança no formato do jornal, o preço e o uso de uma linguagem mais informal tiveram como objetivo tornar o Correio um jornal popular?

O grande objetivo da comunicação deve ser o de abarcar a todos igualmente. O jornal nacional, para mim, é o maior exemplo disso. Quase todos os seres humanos entendem o que o jornal diz. Há neste jornal a preocupação de comunicar a todos, com uma linguagem acessível a todos. Existe uma leitura diária do jornal por uma pessoa que manda um relatório do jornal inteiro, criticando e elogiando os acertos. É uma espécie de Ombudsman interno. E quando tem uma palavra sem tradução isso é reclamado. Quando tem um estrangeirismo no Vida*, quando tem palavras muito específicas do esporte, ou quando é algo não entendido pelo baiano. A gente tem essa preocupação sim. Mas essa é uma preocupação que deveria ser da comunicação. Porque se tem leitores que vão da classe A à D, você tem que se preocupar com isso. Se no projeto inicial havia essa preocupação eu não posso te responder.O editor chefe, Sérgio Costa, tem essa preocupação, e eu também.


Acontece de faltar notícia?Em um dia pouco noticioso, o que vocês fazem para não sobrar espaço no jornal?

Acontece. É uma agonia, porque um dos meus papéis é também tornar esse jornal factual.Conto histórias, mas eu preciso de algum modo dizer porque elas estão acontecendo nessa cidade.Eu não posso contar essa história do nada, preciso de ganchos factuais para contar essa história.Eu não tiro da cartola.O Bruno Surfistinha tinha o gancho da Bruna Surfistinha, do filme e tal.É uma matéria mais fria, e se você observar, esse tipo de matéria sai no Domingo , na segunda, quando são dias mortos.Mas de segunda à sexta tenho que procurar assuntos que tenham a ver com o dia a dia das pessoas. Existem os assuntos factuais dos dias que estão acontecendo, existem os assuntos que não estão necessariamente na ordem do dia, mas dizem respeito à gente. O grande barato, também, é você pegar um assunto que não está na ordem do dia e trazer ele para a ordem do dia.


Quando tem mais notícia que espaço disponível, como funciona o corte de determinada informação?

Pra mim é a pior coisa. Quem tem que cortar isso é o editor. Para mim é desesperador. Meu trabalho é pautar. Eu não seria jamais editora de fechamento, porque já sofro pra escolher, imagina pra excluir.


Por que algumas capas do assinante são diferentes daquelas vendidas nas bancas?

É porque o do assinante já está vendido, e o da banca ainda tem que vender.Na banca a gente coloca normalmente o que a gente considera mais interessante, para o assinante o que é mais relevante.É uma estratégia de mercado que funciona muito bem.

terça-feira, 5 de julho de 2011

“Sensacionalista... Todos os jornais são”: Euzeni Daltro




Flabia Quima e Cátia Aragão




A jornalista Euzeni Daltro, começou sua carreira na área há um ano e já é destaque na sua profissão. Graduada pela Faculdade Dois de Julho, em Salvador, Euzeni trabalha no jornal Massa! do grupo A Tarde. Em entrevista as estudantes de jornalismo da Universidade Federal da Bahia, ela fala do começo da sua carreira e do seu trabalho no jornal.


Como foi o seu percurso como jornalista do grupo A Tarde?
Comecei minha carreira como estagiária no Jornal e depois participei da seleção para o grupo do Jornal Massa. Passei na seleção e hoje atuo como repórter. Gosto muito do Jornal Massa, por ser popular e me identifico com este tipo de jornalismo. Me sinto também importante em participar deste grupo, pois o Massa é o primeiro jornal popular da Bahia.


Qual o processo utilizado na publicação de suas matérias?
Durantes as reuniões juntamente com editores e estagiários, sugerimos as pautas que tenham mais relevância com o público do jornal. Como o Massa é um jornal popular, o processo que utilizamos é escolher notícias que tenham noticiabilidade com o público C e D.


O propósito do grupo A Tarde em criar o Massa foi para favorecer as classes C e D?
Sim. Pois aqui na Bahia precisava de um jornal popular, que não tinha. O Correio tem uma tendência popular, porém ele ainda não se decidiu. Ele não sabe a qual publico vai alcançar. Se é a classe A e B ou a classe C e D. Antes do Massa, você não tinha um jornal popular na Bahia.  Portanto o Massa divulga matérias que o Correio não daria.


O objetivo do Massa é concorrer com o Correio?


Não somente com o Correio, pois o objetivo do Massa é preencher a lacuna das noticias que não são divulgadas nos outros jornais. Tanto que o Massa não faz diferenças entre o que vai ser publicado para o assinante ou não assinante, como faz o Correio. Ele publica as notícias sem medir esforços para quem vai agradar ou não agradar. O Massa divulga problemas de uma camada social não assistida pelos outros e pelas autoridades.


No dia 9 de junho de 2011 foi publicada a notícia sobre o assassinato do motorista de ônibus residente do bairro Cosme de Farias. Quais os critérios utilizados para a construção desta notícia?


Por se tratar de algo novo e que a concorrência não publicou com relevância, o Massa cobriu o fato e o transformou em noticia importante, tanto que foi publicada na página três do jornal. Outra contribuição foi o local público, pois o motorista por ser trabalhador e pai de família foi assassinado friamente em um ponto de ônibus e isso é de interesse do público do Massa. O público que lê o nosso jornal se identifica com este trabalhador que levanta todas as madrugadas para trabalhar e ganhar o seu pão de cada dia.
A morte foi outro critério que contribuiu para a divulgação da notícia e que envolve também polícia. Polícia é o “carro chefe” do jornal. Eu fui cobrir neste dia a manifestação em relação à morte do motorista e observei que morte é de interesse público, tanto que para a divulgação deste fato, pesquisei dados da Secretaria de Segurança Pública em relação aos índices de violência existentes em Salvador e relacionei estes dados com a morte do motorista. Independente de ser famosa ou não a pessoa, a morte de alguém é algo que chama atenção do leitor.


O jornal se preocupa em divulgar notícias de interesse público ou do público? O que deve ser notícia para você?


Tanto de interesse público quanto de interesse do público os acontecimentos que viram notícia têm a ver com a experiência do público e o que este vivência no seu dia a dia. A notícia tem que ter proximidade, como por exemplo, não iremos noticiar algo problemático no bairro da Pituba, porque sabemos que isso não vai interessar ao publico do Massa. Enfim, as noticias do Massa seguem este viés de ser público e do público.


Na sua opinião, como os outros jornais impressos divulgam as matérias sobre Salvador?


Todos eles procuram atender ao seu público. Por exemplo, o jornal A Tarde tem matérias na Editoria Cidade que você não vê no Massa ou visse versa. Acredito que cada jornal divulga as matérias sobre Salvador baseando-se no seu público.


Qual a forma utilizada para hierarquizar os critérios de suas notícias?


O editor define com o repórter as notícias que serão publicadas, de preferência aquelas que causam impacto para o público do Massa. No ano passado, noticiamos sobre os prejuízos que os moradores do Bate Facho sofreram com as fortes chuvas. O Massa utiliza conteúdos do A Tarde, mas há conteúdos nossos que o A Tarde não utiliza e isso é um privilégio, são noticias exclusivas.


Qual a notícia de maior impacto que já publicou?


Foi a dos moradores do Bate Facho que ficaram desamparados e esperando soluções dos órgãos públicos da Prefeitura.


Observamos dois títulos. O editorial “Polícia” do dia 2 de junho “Na tora. Policiais invadem a casa de família” e o editorial “Notícia do dia” do dia 9 de junho “Motô é assassinado e povo vai para a rua”. Eles foram redigidos com uma linguagem informal para alcançar um determinado público? Ou a intenção não é essa na linha editorial do jornal Massa?


Os títulos não sou eu que faço, mas os títulos têm como objetivo chamar a atenção e aproximar o leitor para a notícia. Eu não vejo problema nenhum ter uma linguagem coloquial no texto do jornal. Cada jornal tem uma linguagem e estilo diferente em noticiar.
Nós publicamos, por exemplo, uma matéria sobre o boato do aumento do nível do mar do Rio Vermelho para um metro por causa do tsunami ocorrido na China. Nenhum jornal se interessaria em publicar isso, mas publicamos e trouxemos através do boato, explicações científicas sobre o aumento ou não do mar e que na Bahia não teríamos possibilidade de tal fenômeno.


Como suas pautas são feitas?  Você mesmo escreve ou recebe pautas para cobrir?


Eu sugiro algumas pautas, umas são aceitas e as que não são, eu tenho que cobri-las.


O Massa pode ser considerado sensacionalista?


Sensacionalista... Todos os jornais são. Se sensacionalismo for causar sensação e impacto, todos os jornais causam. Sejam boas ou ruins.  Há notícias que causa mais impacto como violência, assassinatos, e outras notícias que são mais “leves”.


Observamos que há mulheres seminuas nas capas do Jornal Massa. Por que há essas mulheres? Como é feito o processo para a divulgação dessas mulheres?


Como o Massa é um jornal popular ele visa atender sua classe divulgando o que ela que ver. As classes que o Massa favorece que são a C e D, é uma camada da população que compra um jornal com preço acessível e nele há assuntos como mulher, esporte e polícia. E sobre as mulheres, elas enviam fotos, e-mails e se oferecem para aparecer na capa do jornal e assim fazemos a seleção. Quando vemos também alguma mulher com uma beleza diferente nas ruas, a convidamos para aparecer na capa do jornal.

"O concorrente do A Tarde é ele mesmo": Felipe Amorim





Por Fabrina Macedo e Gislene Ramos

Felipe Amorim é jornalista graduado pela Universidade Federal da Bahia em 2009. Começou a trabalhar no Correio* ainda graduando, seguindo para o grupo A Tarde em setembro de 2010. Afirma que a faculdade é boa, mas o aprendizado aconteceu mesmo na redação do jornal. Atuando na editoria de Brasil, chegou a escrever matérias sobre economia e política. E, atualmente escreve para a editoria de Cidade, do jornal A TARDE, na qual foram publicadas uma série de matérias sobre mobilidade urbana, tema bastante abordado nos principais jornais da capital baiana.

- Qual é a sua rotina de produção dentro do jornal?
Felipe Amorim: Primeiro você chega, geralmente vem uma pauta que o editor deixa pra você fazer e ai já é programado se é pauta pro dia, para ser publicada no dia seguinte. Outras vezes são pautas para a semana e ai você tem mais tempo pra fazer... dois ou três dias, às vezes até uma semana.

- Quando acontece da pauta ser definida no dia, em que momento isso acontece? Tem alguma reunião?
FA: O editor de cada área, cidade, política, economia, já programa suas pautas. Todo dia de manhã tem uma reunião com os coordenadores de cada área e o secretário de redação, para definir mais ou menos como será o jornal do dia seguinte. Então cada um vai fazendo suas coisas e no meio da tarde, umas 4 horas, depende do jornal, tem uma outra reunião com as mesmas pessoas, para ver, de fato, o que vai ter mais destaque, o que vai ser manchete ou não. Mas ao longo disso, pode ser que surja uma noticia 2 horas da tarde, você descobre uma coisa nova e muda tudo.

- Na reunião, quais são os critérios que vocês utilizam para classificar uma matéria como noticiável?
FA: Na verdade, eu não sei direito porque eu sou repórter, você já recebe pronto (risos). Mas os critérios são os mesmos... não sei se vocês já leram esse texto sobre critérios de noticiabilidade, quando eu era aluno de Giovandro a gente lia, valor noticia, é mais ou menos aquilo ali. As vezes acontece de a gente ter um assunto que o jornal já está dando uma cobertura legal, ai ganha um peso a mais... aquela coisa exclusiva, ganha um peso a mais.

- Quando você trabalhou no Correio, você identificou alguma diferença em relação aos critérios de noticiabilidade?
FA: Não, nenhuma. Os critérios são os mesmo, acho que em qualquer jornal, qualquer bloco, qualquer TV, vão ser sempre os mesmos. O que muda um pouco é o tratamento daquele material. O correio gosta mais de contar histórias, montar diversos personagens, aquela coisa mais dramática... o A Tarde já vai mais por aquela linha de cobrar das autoridades, aquela responsabilidade de cobrar. Os dois têm as duas coisas, mas o Correio puxa mais para um lado e o A Tarde puxa mais para o outro.

- Acontece de uma determinada matéria não poder ser noticiada em virtude da dificuldade em cobrir ou investigar?
FA: Ah tem, se você não tem muita informação sobre o fato, não tem como aprofundar aquilo.

- Já aconteceu algum caso de alguma matéria estar prevista para sair na capa e aparecer algum outro acontecimento não previsto e a matéria não sair?
FA: Eu não me lembro de algum caso especifico, mas com certeza já aconteceu. (risos)

- No período anterior, por exemplo, teve a questão da morte de Osama Bin Laden, por exemplo, que o Correio* fechou edição e ai o evento foi mais tarde e eles só conseguiram colocar uma nota menor. O A Tarde conseguiu...
FA: Tem um caso muito bacana que foi quando Obama tomou posse. Não sei se você lembra-se da propaganda de que o Correio* ia mudar e ele era um dos “garotos propaganda”, tinha um outdoor com ele. Ai no dia do resultado da eleição, por causa do fuso horário, o resultado iria sair bem mais tarde. Ai o Correio* fechou sem o resultado e o A Tarde e a Tribuna esperaram e saíram já com ele presidente.

- E quais são os valores – notícia que o A Tarde considera mais importantes?
FA: É difícil dizer assim, porque isso nunca é tratado explicitamente no dia – a – dia, mas acho que os mesmo de todos os jornais. O que vai afetar o maior número de pessoas, a força da notícia, se é algo grave ou se não é.

- O que é que o A Tarde considera como uma matéria de interesse público?
FA: Eu acredito que é o que as pessoas precisam saber, aquilo que é importante para a vida delas. Mas tem muitas outras coisas que são de interesse público. Matérias de serviço, por exemplo, também tem ganhado um destaque, o que é bacana.

- E tem algum critério para determinada matéria ir ou não para a capa?
FA: Olha, até nós, repórteres, fazemos críticas do tipo: “tal coisa era pra ser manchete ou tal coisa era pra ter uma chamada de capa e não teve”, mas não é um julgamento tão subjetivo assim, porque tem critérios. Mas depende muito de quem está fazendo a capa no dia, às vezes muda o responsável pela capa durante um tempo e você vê que o jornal fica diferente.

- E quando você acha que determinada matéria poderia ser capa e não foi, quais são critérios utilizados para se chegar a essa conclusão?
FA: Interesse público. Porque aquilo era mais importante para as pessoas saberem. Também é uma questão do público leitor, por exemplo, o A Tarde é um jornal local, não é interessante para o público ter com manchete “meta da inflação”, ou coisa do tipo.

- E tem algum critério específico da editoria de cidade?
FA: É um pouco confuso, por exemplo, as matérias sobre mobilidade. O mote ali é a Copa, mas esporte não está fazendo, quem está fazendo sou eu, de cidade, e mais um repórter de política. Então, quem estava coordenando eram mais editores da área de política. Tem coisas que estão na fronteira e a decisão é mais administrativa do que editorial, pelo conteúdo.

- Qual é o publico leitor do A Tarde?
FA: Eles apostam no publico A – B, justamente para o Correio* ficar brigando com o Massa! e tal. O A Tarde tem uma visão de mercado assim, o Correio* já acha que pode brigar com o A Tarde pelo público A – B também.

- E essa visão de que o A Tarde tem o publico A – B está relacionada com o formato do jornal?
FA: O A Tarde é um jornal que tem mais conteúdo, não que isso seja melhor, mas ele tem mais matérias mesmo, são matérias que dá pra você tratar melhor o tema, identificar melhor, tem mais cadernos... isso tudo favorece o publico que gosta de acompanhar política, economia. Isso é difícil de fazer pelo Correio*.

- E quem são os concorrentes diretos do A TARDE hoje?
FA: O Correio* passou em vendagem, tem gente que diz que é por causa do preço, que está muito barato. Eu acredito que o Correio* não roubou leitores do A Tarde, porque ele conquistou um público que antigamente não lia jornal. Eu acho que o concorrente do A Tarde acaba sendo ele mesmo, no dia em que ele começar a investir mais em conteúdo, matéria especiais, fotos boas, estrutura, mais repórteres pra ter um conteúdo diferente dos outros jornais acho que naturalmente sua qualidade vai corresponder ao público. De grosso modo, o Correio* não disputa o mesmo leitor do A Tarde, embora ache o Correio* um jornal muito bom.

- Você considera que o A Tarde trabalha, pelo menos agora, em virtude dessas modificações da concorrência ou isso não influencia?
FA: Sim, lançou – o Massa! por causa disso. Mas não houve mudanças no jornal em si, depois que o Correio passou a se adequar. Mas o A Tarde contratou uma consultoria, né? Então pode ser essa mudança ainda venha a surgir.

- E com relação à linha editorial do A Tarde?
FA: O A Tarde é um jornal especificamente local, em contraposição aos nacionais como a Folha, que cobre Brasília. Mas dentro de uma cobertura local, acho que o A Tarde dá um peso legal à política e economia.

- E com relação aos demais jornais soteropolitanos, como você percebe comparativamente a linha editorial do A Tarde com as dos demais jornais?
FA: Se for para eu apontar uma distinção, creio que o A Tarde é um jornal mais sisudo, trata com mais seriedade os títulos, não que isso seja bom ou ruim, mas como eu vim do Correio*, eu estava acostumado com uma coisa diferente.

- E você acredita que seja possível construir uma notícia sem que a sua visão pessoal interfira?
FA: Não, não tem como. Você está envolvido com o local, mora aqui a vida toda, a vida toda lê o jornal, acompanha a política... mas a questão é você ser honesto. É bom que sua visão pessoal esteja ali também, porque você é um cidadão, se preocupa com as coisas e as outras pessoas. Agora tem todos aqueles critérios: você deixa a outra parte falar, ouve o maior numero de especialistas possíveis, sem dar muito destaque a alguma coisa que pode ser que seja somente uma opinião. Nas reportagens sobre mobilidade mesmo, a nossa preocupação ao fazer as matérias era não dar mais espaço a uma coisa do que outra, e quando tinha especialista falando mal de uma coisa, colocar outro especialista falando mal da outra, BRT ou metrô. Como é que a gente vai saber qual é o melhor? Eu tenho minha opinião, sei o qual prefiro, mas nem sempre a minha opinião é o que realmente vai ser melhor. Então é importante na matéria a gente equilibrar.

- A gente percebeu durante o período de analise, não somente as matérias que você escreveu sobre mobilidade, mas em relação a outras que o A Tarde vem fazendo... quais as intenções e os critérios do jornal em produzir um grande numero de séries?
FA: Dizem que o A Tarde gosta muito de séries, né? (risos). Eu não sei se eles fazem uma analise do tipo “isso prende o leitor”, mas acho legal porque o espaço de uma página de jornal, mesmo a do A Tarde que é grande, é muito pouco. A série é boa porque aquele tema fica na cabeça das pessoas. Pode ser que nem todo mundo leia A Tarde todos os dias, mas os outros jornalistas leem e se está saindo muito uma coisa, de repente o pauteiro da televisão vê “poxa, isso tá saindo muito, então vou ter que dar também”, ai dá na TV, sai nos blogs e muita gente fica sabendo daquilo.

Rodrigo Lago: chefe de reportagem do Tribuna da Bahia

Rodrigo Lago se formou em jornalismo na Faculdade Integral da Bahia. Há três anos, entrou no Tribuna da Bahia como repórter estagiário e chegou a chefe de reportagem do jornal que já tem 42 anos de circulação.
De quantos jornalistas é composta a redação do jornal?
São 41 jornalistas, incluindo editores e chefe de reportagem.

Quais são as etapas de produção das notícias no Tribuna?
Inicialmente, eu chego na redação pela manhã. Leio todos os jornais. Acesso a internet. Dou uma olhada na TV. Nós temos, aqui, duas pessoas que ficam online o tempo todo também. A partir disso, fazemos uma seleção do que vamos publicar levando em consideração os critérios de noticiabilidade. Procuramos histórias interessantes, analisamos a importância, tentamos produzir discussões sobre temas relevantes que afetam a cidade. Depois, eu faço a pauta a partir dessa pesquisa e de coisas que eu vejo no meu dia-a-dia. Também recebo sugestões de toda a equipe. Sempre digo que é muito importante aos repórteres estarem atentos ao cotidiano. Se eles vão a um bar ou a um restaurante, que procurem enxergar uma situação interessante ou visualizar algo que possa ser válido pro jornal. Enfim, com a pauta produzida, eu as passo para os repórteres. Eles, quando necessário, vão pra rua apurar a reportagem e fazer entrevistas, voltam pra redação e fazem o texto. O texto pronto passa pelo editor e pelo revisor e, só então, vai para a diagramação.

Como você caracteriza a linha editorial do jornal?
É uma linha extremamente política. Mas, sempre buscando muita imparcialidade na notícia. O Tribuna não fica preso a nenhum tipo de valor.

E por que essa preferência por notícias de cunho político?
Pela história do jornal. O Tribuna sempre esteve envolvido em questões políticas. Durante muito tempo, inclusive, foi perseguido.

Em sua opinião, qual é a principal diferença entre o Tribuna e os demais jornais impressos da cidade?
É justamente essa imparcialidade da qual eu falei anteriormente. O Tribuna não está preso a grandes grupos nem nada disso. Nós somos livres.

Qual você imagina que seja o perfil do leitor do Tribuna hoje?
O Tribuna tem um público bem específico. São políticos, principalmente. Secretarias de governo também. No geral, são pessoas que tem que estar sempre muito bem informadas.

Em que medida esse perfil interfere na seleção das notícias?
Totalmente. Nós pensamos no nosso leitor o tempo todo.

Você acha que o perfil dos assinantes difere do perfil dos leitores comuns?
Não. Com relação ao Tribuna, é bem parecido.

Quais os critérios vocês mais valorizam na hora de selecionar e hierarquizar as notícias?
Bom, nós sempre procuramos noticiar projetos políticos. Por exemplo, projetos de vereadores ou de deputados que vão, diretamente, afetar a vida da população em geral. Além de assuntos polêmicos que estão sendo vastamente discutidos. Nós tentamos sempre problematizar essas questões.

Você disse que o Tribuna procura noticiar projetos que irão afetar a vida da população. Isso quer dizer que vocês valorizam o interesse público acima do interesse dos seus leitores?
Sim. Quanto mais pessoas a notícia afetar, mais ela é importante.

Em comparação aos outros jornais da cidade, o destaque dado a temas policiais parece ser menor no Tribuna. Por que vocês parecem não valorizar tanto esse tema?
Realmente, a gente procura não se ater a esse tipo de informação porque, infelizmente, a violência virou estatística. Então, não adianta o jornal cobrir, todos os dias, um assassinato ou um caso de um marido que esfaqueia a mulher já que, hoje, isso só acaba em números.

Como o Tribuna tem lidado com as recentes mudanças nas formas de comunicação?
Nós temos o Tribuna Online que, recentemente, passou por um processo de reformulação. Nosso setor de publicidade tem trabalhado muito pra vender esse produto. O site possibilita muita interatividade. O internauta pode, por exemplo, comentar as notícias. Nós procuramos estar sempre de olho nessas mudanças.

Thiago Pereira: Repórter do Tribuna da Bahia

"O trabalho 'sujo' é feito pelos editores"

Como a delimitação de um público-alvo afeta seu trabalho, como jornalista/repórter?

Não há uma delimitação, ou pelo menos ela não é perceptível. O Tribuna é lido por pessoas de várias classes sociais e costumo escrever um pouco sobre tudo. Nem mesmo minha linguagem é alterada nas matérias. Aprendi na faculdade que se deve escrever matérias para que um advogado e um vendedor de picolé leiam e compreendam a mensagem. É o que tento fazer sempre.

Qual o principal critério repassado para você como essencial na abordagem das matérias?

Ser diferente. Na verdade aprendi isso desde cedo e é algo que todo jornalista tem que buscar. Um lead original, uma abordagem diferenciada, o assunto sobre outra ótica. Acho que isso é fundamental no jornalismo, além, é claro, de abordar o assunto profundamente, objetividade e clareza.

A seção ‘coluna social’ do Tribuna fica no caderno de cidade. Trata-se de um interesse do público do jornal? Não se vê colunas sociais tão ‘glamourosas’ em outros editoriais...

O Tribuna tem bom desempenho entre as classes sociais de maior poder aquisitivo de Salvador. O que ocorre na alta sociedade baiana é de interesse desse público. Por isso a coluna social do jornal tem tamanho destaque. Ela fala de um assunto que é de interesse de parte dos leitores cativos do jornal.


Como você define a linha editorial do Tribuna?

O Tribuna possui uma linha editoria voltada para as classes A, B e C. Abordamos questões relativas à problemas da cidade, como buracos (http://www.tribunadabahia.com.br/news.php?idAtual=83770), enchentes ou desabamento de casarões (http://www.tribunadabahia.com.br/news.php?idAtual=83106). Por vezes elaboramos matérias especiais, mais literárias (http://www.tribunadabahia.com.br/news.php?idAtual=83106) ou mais rebuscadas, com apuração que demanda mais tempo (http://www.tribunadabahia.com.br/news.php?idAtual=84231). A editoria de política do jornal é muito forte. Entrevistas com políticos baianos de destaque são publicadas a cada segunda-feira. Também há matérias sobre bastidores, o que atrai muitos leitores. Cidade e Política são os carros-chefe do jornal, já que possuem abordagem diferenciada dos demais impressos da cidade. Esporte têm bastante semelhança com qualquer outro meio especializado no assunto no estado. Dificilmente há uma matéria especial ou entrevista com algum desportista importante. Cultura não é tão forte, mas ainda assim possui público cativo. Ela também se limita a reproduzir o conteúdo de shows e filmes em exibição na capital baiana.


Alguma vez você precisou guiar uma reportagem por um caminho que você julgasse menos apropriado por conta de fatores organizacionais?
Sim. Isso é comum em qualquer jornal na Bahia. Os meios de comunicação não conseguem sobreviver apenas com a tiragem e são obrigados a aderir uma política editorial que não permite certas abordagens. Para gerar receita publicitária, os editores acabam omitindo críticas ou adiando pautas. Já tive matérias totalmente reescritas por conta disso. Procuro fazer minha parte. Escrevo o que vejo e o que minhas fontes relatam. O trabalho “sujo” geralmente é feito pelos editores.

A questão da mobilidade em Salvador tem sido tema recorrente em nossos jornais. Você já abordou esse assunto em alguma matéria? De que modo essa abordagem insere a Tribuna no perfil de jornal de Salvador?


Sim. Abordei em uma matéria que questionava se Salvador estaria pronta para receber jogos da Copa do Mundo (http://www.tribunadabahia.com.br/news.php?idAtual=76185) . O Tribuna foi o único a fazer algo do tipo, não apenas abordando a mobilidade urbana, mas incluindo também outros fatores essenciais para uma cidade-sede. O objetivo era não se limitar a apenas um ponto e abrir o leque de problemas que a capital baiana apresenta para abrigar um evento desse porte, se diferenciando, por conseqüência, dos demais jornais, que abordaram apenas as características de cada modal apresentado para solucionar os problemas de mobilidade de Salvador. O Tribuna possui esse perfil de questionar as questões mais a fundo e abrir o horizonte da pauta. É o meio que achou para sobreviver entre o A Tarde e o Correio, jornais lideres em tiragem no estado. Nem sempre é feito, mas é o que se deve fazer.

Jamile Gonçalves e Juliete Santos