quarta-feira, 27 de junho de 2012

“O Massa é a voz que o povo não tinha” | Márcia Gomes

Rebeca Menezes, Diego Yu e Aymée Brito


Márcia Gomes é formada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso do Rio de Janeiro, onde nasceu. Com residência em Salvador há 19 anos, há sete está no Grupo A Tarde. Lá, começou como revisora do Jornal principal e mais tarde passou a ser repórter de informática. Voltou ao grupo em 2005, sete anos depois, como repórter e em outubro de 2007 passou a ser editora internacional do Jornal A Tarde. No segundo semestre de 2010, ela foi transferida para a editoria de cidades.
O Jornal Massa! surgiu em Maio de 2011 e, com a proposta desse novo modelo de comunicação dentro da empresa, Márcia migrou para a editoria de polícia no Massa!. Atualmente, ela é editora de Economia Popular e Cidades neste jornal, que tem tiragem de 26 mil exemplares ao dia.


Como é a sua rotina de trabalho no Massa?
Bom, de segunda a sexta eu trabalho das 14h até em média 22h, 22h30. Não trabalho nos sábados, e nos domingos,trabalho uma semana sim, uma semana não. Quando a gente chega, vê o que tem no noticiário, o que tem no noticiário de A TARDE que pode ser aproveitado para o perfil do Massa, dá uma olhada nos sites, dá uma checada pra ver se foi o que foi deixado de pauta no dia anterior está tudo cumprido, se tem prolongamento, o que caiu, o que não caiu, se os repórteres e estagiários já bateram as matérias na página, se está faltando alguma coisa - foto, alguma informação, alguma personagem que está sem sobrenome... Enfim. Suprir aquelas dúvidas. Logo em seguida, a gente vai pra uma reunião onde vamos discutir as pautas principais e cada um vai apresentar o “cardápio” da sua editoria. Eu, neste caso, levo o que eu tenho pra oferecer no dia sobre economia popular e sobre cidade. Feita esta reunião, a gente vai partir mais pra edição do dia das matérias fixas, que são as primeiras que vão pra máquina, as primeiras que a gente fecha. Eu, teoricamente, fecho quatro páginas por dia. Eventualmente posso fechar um pouco mais, ou um pouco menos, isso também depende de sair anúncio (publicitário), porque se sai, as páginas diminuem. Ontem, por exemplo, eu não fechei quatro, fechei três. Mas quando sai muito anúncio, aí o jornal tem que aumentar, porque existem conteúdos que não podem deixar de sair, então em vez de sair com 24 páginas, o jornal sai com 32. E isso às vezes implica no aumento da rotina de trabalho da gente, carnaval, por exemplo, saía muito anúncio e assim mexia muito com a estrutura do jornal, era uma loucura. Mas no geral acontece dessa forma. Daí a gente vai acompanhando os repórteres na rua, o que eles vão fazendo. Matérias que são pra um dia, às vezes se transformam em matérias maiores; as matérias que vão ser editadas no final de semana pra sair na segunda não dão pra saber, então tem que ter matéria de gaveta.  Nessa cidade não acontece muita coisa, então a gente tem que se precaver já que o número de páginas continua igual. 

Então tem que preencher um número exato de páginas?
Tem que preencher. E sem que haja perda de qualidade, se cria o cuidado. Vocês que passaram muito tempo analisando as editorias, vocês podem observar que a gente traz bastante coisa dos outros noticiários, mas a gente tem bastante coisa exclusiva, como nós, como os personagens. O massa fala de uma forma popular, ele é um veículo em que o leitor dele tem que se espelhar, se identificar, se reconhecer nos textos. Tanto nos dramas, quanto nas comédias. O jornal, apesar do “carro-chefe” ser segurança, polícia, é um jornal que tem matérias engraçadas, matérias assim meio fantásticas. Apesar de agora ter se modificado um pouco.



O que acontece quando não tem nada pra preencher as páginas?
É isso, a gente trabalha preparado. Tem sempre material atemporal guardado. Porque, por exemplo, hoje haverá uma manifestação de estudantes no Campo Grande. Aí a repórter vai, e não tem. Precisa de algo que substitua em caráter de urgência. O espaço está lá e a gente precisa utilizá-lo. Por isso sempre tem matéria pra cobrir: matéria pronta, matéria encaminhada, tem matéria de A TARDE que a gente pode utilizar, entendeu?  Sempre tem alguma coisa, a gente sempre trabalha com material que possa substituir e preencher aquele espaço. Nunca ficamos descobertos. Não existe isso, até porque tudo é muito rápido, tem hora pra entregar, tem linha de crescimento. Não pode correr o risco de depender apenas daquilo.

Quando você diz matéria de A TARDE, seria o que exatamente?
Tudo. Por exemplo, eu aqui eu sou de cidades e economia. Aí eu vou buscar saber o que essas editorias do A TARDE estão preparando pra hoje. Quais as principais matérias de economia que ele está preparando pra ser divulgada no outro dia. Se for alguma coisa que se encaixe com meu público, eu vou esperar a publicação dele e usar de alguma forma, nem que seja pra transformar em gaveta – seu eu puder guardar e elas não perderem a validade, fazemos muito isso. Exemplo: “O Governo congelou o IPI dos produtos de linha branca”, isso interessa pro nosso público: geladeira, fogão, etc. Isso ta na sessão de economia de amanhã, no A TARDE. Eu vou lá, pego e utilizo o material, dando créditos de fotos e reportagem. Não existe só fazer matéria para o A TARDE, ou para o Massa, a empresa é única e a produção de conteúdo é em conjunto, porém com duas linhas editoriais diferentes, e a gente faz a adaptação do texto ao público leitor, aos distintos públicos-alvo. Tem termos, palavras, que a gente utiliza em A TARDE que não pode utilizar em Massa e vice-versa. Eu não posso usar um vocabulário rebuscado para o público do Massa, porque muita gente não vai conseguir compreender. Precisamos utilizar uma linguagem popular, uma linguagem simples, objetiva, muitas vezes usamos gírias. Isso atrai a atenção do público, é o universo da língua que ele fala.

Então num geral, existem os repórteres de Massa e A TARDE, mas eles transitam de acordo com a necessidade dos jornais?
Não existe essa fronteira.  Um exemplo são os releases que as vezes a gente recebe de assessorias de imprensa iguais no A TARDE, no Massa. A gente ta sempre “batendo uma bola” sobre aquilo que cada um recebe, pra saber o que chegou lá, o que veio pra cá, o que precisa ser enviado. Porque não faz sentido a empresa mandar dois repórteres para cobrir o mesmo evento. Vai apenas um, e esse repórter é orientado, e ele vai saber que pro A TARDE ele precisa ter uma ‘pegada’ e pro Massa, ele precisa ter outra. Muitas vezes ele escreve pro Massa e depois parte pro A TARDE, ou pode acontecer o contrário. A nossa equipe ainda ta em um período de adaptação, porque isso é muito novo no jornalismo baiano, mas até que eles estão bem afiadinhos.

Você falou que os jornais do grupo têm linhas editoriais diferentes. Qual seria a linha editorias no jornal Massa?
Popular. É um jornal popular.

E o que é um jornal popular?
Um jornal popular é um veículo de comunicação pros chamados populares, para as classes C e D. Alguns dizem E, mas eu acho que considerar a E é meio “barra pesada”, é demais. É pra empregada doméstica, pro gari, pro porteiro, enfim. Pra galera que mora nos bairros populares, galera que mora em Cajazeiras, em Castelo Branco, na periferia da cidade. Algumas pessoas falam que não gostam do Massa, por conta de sua linguagem e abordagem mas elas não entendem que o Massa tem um público alvo, e que provavelmente se você entende que o jornal foi feito para agradar o público, se utilizando de linguagem popular, você não está inserido neste público a ser atingido. Eu até entendo que pessoas de outras áreas não compreendam o que é um produto de comunicação, mas um estudante de Jornalismo tem a obrigação de saber que um produto de comunicação pra ser lançado no mercado, ele não é lançado gratuitamente. Ele passou por um período de encubação, pesquisa, de saber o que o público desejava. O Massa não é feito por nós, porque a gente acha bonitinho, ele é feito porque o Grupo descobriu que o público quer aquilo!  Qualquer jornal popular, vocês podem olhar os do Rio, São Paulo, Minas, tem a mesma fórmula, são todos iguais. O colorido é igual, mulher bonita e semi-nua nas capas. No maior da América do Sul, há mulheres completamente nuas. O Massa nunca publicou uma foto de um cadáver e nem gota de sangue, e isso eu te afirmo porque eu fui editora de polícia durante um bom tempo.


Por quê?
Porque foge do comercial, porque não há necessidade de fazer um apelo tão forte. É preciso de cuidados para não cair no mal gosto, é preciso manter um equilíbrio, e o Massa tem isso.

Qual você acha que é a importância das mulheres seminuas na capa? Porque é uma coisa que muitas pessoas criticam, acham inclusive sexista, machista.
Isso é parecido com aquilo que eu já falei com você: a gente dá pro público aquilo que as pesquisas nos mostraram como necessidade do consumidor. Quando o Massa foi lançado, eu não conhecia o jornal popular, eu nunca tinha trabalhado com jornal popular – eu trabalho aqui há sete anos. Me ofereci pra vir, pra conhecer essa outra ‘pegada’ do jornalismo. E ai eu perguntei se haveria uma mulher semi-nua na capa sempre e eles me responderam que o Massa é resultado de pesquisa, e segue rigorosamente os conceitos por ela descobertos.

Dentro da linha editorial do Massa, qual seria a notícia que você consideraria como ideal para o jornal?
Hoje os valores das famílias são deteriorados, os lares estão desajustados, os jovens estão muito perdidos... E isso não é papo moralista não, que eu não sou careta, nem nada. As coisas que a gente observa, até por conta da profissão mesmo, a gente vê que o grande problema - lógico que a violência é uma coisa absurda hoje em dia, mas o que falta pro ser humano ser feliz, pra não entrar no tráfico, é que você tem que dar o que está faltando: você tem que dar estudo, você tem que dar emprego, você tem que dar moradia, você tem que dar saúde. Esse povo não tem isso. O povo não tem isso. Vocês já foram em um posto do SUS? Vocês tem plano de saúde? Você não tem noção do que é um posto do SUS em um bairro da periferia. É de chorar. Tem coisas que você só entende quando trabalha em Polícia e Cidade, que você vê uma realidade. Você mora aonde? Vocês já foram em Tubarões? Pois é, é isso. O jornalismo diário, o hardnews como a gente chama, Cidade, Polícia, Política, joga o repórter na rua de uma maneira, assim, tão "tapa na cara", você começa a ver o mundo de uma maneira tão mega, que várias fichas vão caindo na sua cabeça. Por isso que eu tô dizendo a vocês, não percam a oportunidade de botar a mão na massa do hardnews. Porque tem gente aqui, por exemplo, que às vezes tem a oportunidade de entrar em editorias mais leves, às vezes Cultura, Esportes, e não passa, nem trisca, no hardnews. Eu acho que  assim passa pelo largo, não foi "mordido pela mosca". E eu acho que o jornalista tem que ser mordido pela mosca. Você cria sangue no olho. Não é que você endureça, mas você cria uma pegada diferente. Caem as ilusões. Quando eu comecei a estudar jornalismo, meu Deus do céu, eu tinha tantas ilusões. Eu achava que... Eu não entendia que uma empresa de jornalismo é uma empresa, que tem um faturamento, tem anuncio. Até bem pouco tempo eu ficava irritada quando entrava anúncio na minha página e eu tinha que redesenhar e refazer tudo. Mas não tem outra, gente. Não tem como você brigar. Se o prédio tá em pé é porque tem anúncio. Se não tem anúncio, não tem jornalismo. São coisas com que você vai aprendendo a lidar com o dia-a-dia, né, que nem sempre são muito agradáveis. Mas que são importantes. E não espere entrar na profissão pra conhecer esses lugares não, dar uma volta na cidade. Vão a Cajazeiras, a Suçuarana, a Novo Horizonte, a Tubarão, a Ilha Amarela, a Periperi, Paripe, Águas Claras. Conhecer a cidade. Tem gente que... Outro dia tava passando na televisão uma criatura que não podia sair de casa de carro porque tinha um buraco tão grande na porta da casa dela que se saísse o carro ficava no buraco. São coisas que a gente nem imagina, né, que a gente mora em bairros privilegiados, mas tem coisas absurdas aí, nessa cidade de João Henrique, nosso prefeito amado (risos).

Você falou da questão que o jornal é uma empresa e tal. Até que ponto as necessidades empresariais interferem na produção da notícia?
Boa pergunta! Aqui, nesta empresa, graças a Deus, eu não tive problemas com relação a isso. Nas outras empresas eu não posso dizer que isso não aconteça.  Mas aqui a gente não tem esse problema. A gente faz jornalismo, graças a Deus. E, no dia em que isso não puder acontecer eu vou mudar de profissão, vou procurar outro lugar pra trabalhar, porque aí vira literatura, não é jornalismo. Vamos falar sobre Chapeuzinho Vermelho, sobre Cinderela... Se você não pode falar sobre o que ta acontecendo, você vai escrever literatura.  Aí eu fico em casa, vou virar ghostwriter, sei lá.

Você tem várias matérias em um dia. Como você define qual vai ser a capa, qual vai ter mais destaque, qual vai ter menos destaque?
A capa quem faz é a coordenadora do Massa, Ana Paula. Eu até fecho capa, assim, mas só nos domingos. Quando ela tá folgando eu fecho. A capa é um processo árduo, um parto. Porque a capa é a costura de toda aquela edição. Então você vai ter que ver o que tá mais forte naquele dia. Polícia? É uma fofoca? É um depoimento? É Cidade? É o que "tá bombando" no dia. Você tem que se colocar, o tempo inteiro, no lugar do leitor. A gente não pode nunca perder o tino do leitor. Você tem que estar o tempo inteiro se colocando no lugar: O que o público quer ler? O que vai chamar a atenção dele? E às vezes pra nós é muito difícil, porque nós não somos o público-alvo do Massa. Eu sou o público-alvo do A Tarde, mas eu não sou público-alvo do Massa. Então pra mim é um exercício diário, contínuo, de me colocar no lugar dessas pessoas. Isso não é uma coisa ruim, eu só tô querendo explicar pra vocês como é que funciona a coisa. Então, por exemplo: digamos que a gente tem uma edição mais morna de Polícia e teve uma fofoca bombando de Entretenimento, como essa semana que teve aquela da Nicole Bahls com aquele jogador. Então é isso. O povo gosta de fofoca. Todo mundo gosta de fofoca. Até o público do A Tarde gosta de fofoca. Não dá pra colocar fofoca na capa do A Tarde, né. Mas todo mundo gosta de fofoca, da vida alheia. Isso funciona muito no Massa. Então é muito relativo. Você tem um crime de grande repercussão, como esse dos dois meninos que foram espancados, que acharam que eram homossexuais e eram irmãos. Esses casos têm grande repercussão. Então a gente observa sempre isso, o que vai chamar atenção. Porque como eu disse antes, jornalismo é filosofia, é paixão, é amor, mas também tem que dar dinheiro. Qual é a função do jornal ir pra rua? Vender. Então a gente tem que vender jornal.

Então o que permite que o Massa tenha uma capa de fofoca, e o A Tarde não, é o público-alvo daquele jornal?
Com certeza, é o público-alvo.

Algumas pessoas defendem que o Correio também é um jornal popular, e que nesse caso seria um concorrente do Massa. Vocês vêem o Correio como um concorrente?
Eu preferia não falar sobre os outros veículos. Eu acho que não é muito ético. Eles até falam muito do Massa. Eu já vi entrevistas de pessoas que trabalham no Correio que falaram tanta coisa do Massa. Gente, esse povo nunca leu o Massa. Dizendo que é um banho de sangue... A gente nunca publicou a foto de um cadáver. Esse povo é louco.

Tem muito preconceito em relação ao Massa.
É... Assim, eu prefiro acreditar que é por pura ignorância. Ignorância no sentido de desconhecimento, de falta de conhecimento do produto.

E como você encara esse preconceito que existe em relação ao Massa?
Desconhecimento. Porque o público do Massa ama o Massa. Eu tava até falando com uma repórter. Até pouco tempo ela estava no A Tarde, e agora ela tá no Massa. E aí, é engraçado. Quando ela trabalhava no A Tarde, ela é uma pessoa muito dinâmica, sempre foi... Mas agora ela anda tão serelepe! Eu falei ‘venha cá, você tá muito serelepe. Você tá gostando da experiência no Massa?’ e ela ‘Ó, eu não vou mentir. Quando a gente vai lidar com a fonte que é autoridade, e eu digo que sou do Massa, o povo meio que não gosta muito, meio que rejeita, olha pra gente atravessado. Mas quando eu chego nos bairros populares, nas comunidades, o povo só falta me carregar. E quando eu era de A Tarde, acontecia o contrário. Quando a gente chega nos órgãos públicos e se identifica como repórter de A Tarde, o povo puxa cadeira, o povo te dá cafezinho, te dá uma água, é aquela paparicação.’ E é mesmo.

E o A Tarde nos bairros populares...
Não... Assim, o povo não maltrata, não destrata. Mas o povo ama o repórter do Massa. O povo adora, é apaixonado... É aquela coisa mesmo, do público-alvo, que é muito fiel.

Como é feita a pesquisa pra saber o que o público... Como vocês sabem o que o público-alvo quer?
É marketing. O marketing pesquisa, não é a gente. Tem a equipe do Massa que é encarregada, incumbida de fazer isso, foi incumbida de fazer isso antes do lançamento do jornal, em um período acho que de quase um ano, um ano e meio. Não é da noite pro dia, é um processo de gestação. A criança é moldável... A não, vai ser assim, vai ser assado, vai ter isso, vai ter aquilo, quantas páginas, quais as cores, como vai ser a diagramação... Tudo é pensado. Não pensem vocês que é porque é bonitinho. Nada é gratuito.

E vocês recebem algum tipo de feedback? Por e-mail, por carta...
Muito. Muito. E-mail, carta, bilhetinho, bilhete de guardanapo, papel de pão, escrito com erro de português, sem erro de português, abraço, beijo... Agora mesmo, essa repórter que eu falei fez uma matéria com Márcio Vitor, que deu manchete acho que ontem ou anteontem, dizendo que ele queria ser ministro da cultura. E aí quando saiu a matéria ele tinha pedido pra ela pra mandar o jpeg, o arquivo da capa e da matéria. Aí ele botou no facebook, fez um carnaval danado, disse que foi a matéria mais importante da vida dele. Imagine. Márcio Vitor, que é uma celebridade da música baiana, e tal. Mas é uma celebridade muito ligada ao público do Massa. O público do Massa é Márcio Vitor. Como ele mesmo canta, ele é periferia, é periferia total.

Como você encara o papel do Massa no meio dos veículos de comunicação da Bahia?
Eu acho que é a voz do povo. O Massa é a voz que o povo não tinha. E as pessoas dizem isso pro repórter: ‘Poxa, vocês estão dando a voz que a gente não tinha. Nenhum veículo nunca nos deu a voz da maneira como vocês nos dão’. O Massa faz isso. E isso incomoda. Talvez seja por isso que o Massa incomode tanto.  Porque é a voz do povo, é a voz do cara que não tem dente, do cara que não sabe falar direito, do cara que só fez até a terceira série primária, do cara que é explorado, da empregada doméstica que não ganha nem um salário mínimo. É a voz dessa galera. O Massa é o povão. Eu fico muito emocionada porque... Imagina, eu fui da editoria de internacional durante muitos anos, então eu vivia “fora” do país. E aí de repente eu passei um tempo em Cidade aqui e fui pro Massa. E como eu estava alienada! Como existia uma Salvador que a muito tempo eu não botava os olhos! Até porque eu não moro na periferia, eu moro em Brotas, no meu mundinho burguês. E aí eu fui ver que... Tem uma coluna na página oito, que se vocês puderem ler, leiam, ela se chama Ombro Amigo. Ombro Amigo é a galera que tá fazendo a casa e acabou o cimento, e pede um saco de cimento a quem puder ajudar pra acabar de construir a casa. É aquele filho que pede uma fritadeira de pastel pra mãe dele vender pastel na porta de casa porque não tem dinheiro pra comprar comida. Sabe, são coisas assim tão... Viu como as pessoas são carentes, como estão necessitadas de coisas tão básicas, tão mínimas? E aí a gente sai, e gasta em uma mesa de bar o que? R$ 100, R$ 150? Tem gente que ganha isso por mês. Então eu acho que a gente, que é formador de opinião, tem que estar em contato com o que acontece lá no mundo do seu Barack Obama, lá nas Europas da vida, mas tem que saber o que acontece aqui também. Porque se no Stiep tem os prédios maravilhosos, as casas maravilhosas, tem as favelinhas também. Eu não sei nem o nome daquelas favelinhas. Você sabe o nome delas? Pois é, a gente fecha os olhos, a gente não vê.  Jornalista, estudante de jornalismo, tem que estar com os olhos abertos para isso tudo. Porque se vocês não tiverem um olhar crítico, quando vocês forem pra rua fazer matéria, entrevistar, vocês vão fazer perguntas superficiais. E perguntas superficiais produzem matérias medíocres. Você tem que saber meter o dedo na ferida. Meter o dedo na ferida da autoridade, do governador. Não tem que ter medo de olhar no olho do governador. ‘Governador, excelência”, mas meta o dedo na ferida. Com respeito, educação. A gente tem que ser a voz do povo. Você tem que perguntar o que aquele carinha ali quer, aquela pergunta que ele não sabe formular. Ele não sabe redigir, ele não sabe falar. Não tem oratória. Comunicólogo tem que ter. Eu acho, pelo que eu vejo, pelo que eu acredito, que os estudantes de jornalismo são muito mal preparados. Não quero saber de quem foi a culpa. “Ah, é porque eu não estudei português na faculdade”, faculdade não é lugar de ninguém aprender português. Isso se aprende até o segundo grau. Na faculdade, teoricamente, você já sabe o que é a língua portuguesa. “Ah, porque eu nunca ouvi falar de Nietzsche." Leia. Vá ler, pesquisar. Leia a bibliografia do curso. Se não conseguir ler tudo, leia parte da bibliografia. Informação, gente. A gente trabalha com informação, cultura, o tempo inteiro. Você consegue identificar, em uma matéria, um repórter de cultura mediana de um repórter de cultura aprofundada. Pelo vocabulário, pelas conexões, pelas ligações que ele faz no texto. Isso a gente só consegue lendo. Lendo tudo: lê site, lê revista, lê jornal, lê livro. Muito, muito, sempre. Até palavra cruzada. É fundamental.

Você falou mais cedo que quem faz o Massa, geralmente, não é quem lê o Massa.
Não, eu não disse isso. Disse que quem faz o Massa não é o público alvo do Massa. Nós fazemos um jornal, para um público alvo ao qual nós não escolhemos. Porque nós somos jornalistas, nós não somos público.

Então isso é um ponto positivo do Massa? Por ele estar dando voz às pessoas que não conseguiriam ter.
Eu acho. Não que os outros veículos não dêem, mas eu acho que o jornal popular - não é o Massa, eu falo pelos jornais populares em geral - dá muito mais.

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